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domingo, novembro 29, 2009

Summer Wars

Summer Wars é uma longa-metragem de anime, realizada por Mamoru Hosoda (The Girl Who Leapt Through Time) em 2009. Foi produzido pelos Estúdios Madhouse.

Summer Wars conta-nos a história de Kenji, um rapaz tímido que um dia é “recrutado” por Natsuki, uma colega mais velha, para um trabalho de verão em casa da família dela. Mas ao chegar ao destino, Kenji descobre que o trabalho consiste em se fazer passar por noivo de Natsuki durante o aniversário da avó, diante de toda a família. É durante essa provação que Kenji recebe uma estranha mensagem no telemóvel, um código que este, sendo bom a Matemática, resolve rapidamente. Mal sabia ele que a solução causaria o caos no OZ, um mundo virtual a que todo o mundo tem acesso e do qual está extremamente dependente.

Começando pela animação, esta é bastante boa, digna de uma longa-metragem e não deixando desiludidos os fãs de The Girl Who Leapt Through Time. Apesar de o desenho das personagens ser um pouco plano, é essencialmente nos cenários e nas cenas que se desenrolam no mundo virtual que se nota o brilhantismo da arte e da animação. Pena que esse brilhantismo não seja transportado para o argumento e para a caracterização de personagens.

A grande falha do filme está em abrir portas e não as fechar. O filme introduz-nos excelentes premissas que acabam por nunca ser totalmente desenvolvidas. O mundo virtual apresentava um potencial gigante em termos argumentativos, servindo de analogia, mesmo que um pouco extrema, para o actual fenómeno das comunidades online e para a nossa actual e cada vez maior dependência tecnológica. Só o próprio nome dado ao universo, OZ, dava pano para mangas, no sentido de nos remeter para o mundo fantástico e irreal do Feiticeiro de Oz. E a própria existência daquele vilão poderia dar-nos uma perspectiva interessante sobre o desejo de aprendizagem e conhecimento, transformando algo tão valorizado pela nossa sociedade em algo que pode ter consequências negativas. Mas ao invés de desenvolver tudo isto, o realizador prefere dar mais ênfase ao ambiente mais rural e familiar que o clã de Natsuki providencia. Isto nota-se sobretudo na primeira meia-hora de filme: depois de uma explicação inicial dedicada ao mundo virtual, tão tecnologicamente evoluído, segue-se uma introdução exaustiva da família de Natsuki e do seu respectivo modo de vida, sem no entanto mostrar uma ligação entre eles e quase nos fazendo questionar qual a influência que um tem sobre o outro. Ainda que a intenção fosse de comparar e contrastar esses dois mundos, a distância entre eles é tão grande que essa ligação perde todo o significado. Também ao longo do filme se notam algumas tentativas de comparações, contrastes e paralelismos, mas quase sempre falhados. Os jogos de basebol que decorrem em paralelo na televisão, por exemplo, só por uma única vez são bem sucedidos em espelhar a acção principal.

Em termos de desenvolvimento de personagem, Summer Wars fica muito aquém do seu antecessor, The Girl Who Leapt Through Time. Enquanto que nesse há um grande ênfase na personagem principal e na sua evolução, em Summer Wars isso não acontece, havendo até alguma dificuldade por vezes em perceber de todo qual é a personagem principal. Tudo indica que será Kenji, sendo este primeiramente introduzido como uma figura fraca, tímida, com alguns problemas de socialização, mas com um claro potencial de evolução. No entanto, o passado da personagem, que é sempre tão necessário a fim de perceber as suas acções e reacções, é completamente descurado, sendo novamente subaproveitada a ideia do contraste: sendo a explicação do passado de Kenji resumido a duas linhas de diálogo, a intenção de contrastar a sua vida solitária com a alegria de ter uma família enorme acaba por não causar qualquer impacto no espectador. A própria evolução da personagem é demasiado inconsistente: quando Kenji parece finalmente ganhar alguma coragem e determinação, é apresentado no momento seguinte como o fraco e tímido rapaz que era ao início. O próprio clímax do filme, ou seja, a cena expoente máximo do argumento e da animação, e que devia pertencer a Kenji, mostrando como ele é capaz de estar à altura da situação, é-lhe injustamente roubado e ridiculamente atribuído a Natsuki, uma personagem completamente plana e cujo papel na história, especialmente na hora de filme anterior, tinha sido bastante passivo.

Ao nível secundário, a enorme quantidade de personagens não permite desenvolver o passado e até mesmo as personalidades das figuras mais relevantes. A avó, matriarca da família, parece ter uma grande influência sobre outras personagens, como nos é dado a entender através dos inúmeros telefonemas que ela faz aquando do momento de caos causado pela falha no OZ. Essa cena é aliás, das mais bem conseguidas no filme, mostrando que a líder da família que lutou em guerras passadas, está à altura do seu nome e do seu título e, como qualquer líder, é perfeitamente capaz de comandar e incentivar as suas “tropas”. No entanto, nunca se percebe exactamente o porquê dessa influência. O que fez ela, que tipo de vida levava, para conseguir que toda a gente à sua volta a respeitasse e ouvisse o que ela tinha para dizer? E quando ao Wabisuke… a personagem tinha algum potencial, mas no final de contas, foi pobremente desenvolvida, acabando até por se tornar incongruente. Qual o motivo das acções dele? Porque roubou ele o dinheiro, porque se ausentou durante dez anos, dedicando-se a desenvolver um projecto que, segundo ele, deixaria a avó orgulhosa dele? Ela aceitou-o de imediato e é dito directamente que tinha imenso orgulho que ele passasse a pertencer à sua família. Porque sentia ele então que lhe tinha de provar algo?

É portanto o conceito de família e que é importante protegermos a mesma a principal mensagem transmitida pelo filme. É uma mensagem interessante, sem dúvida. Mas o que é que isso tem a ver com o mundo virtual e tecnológico? Porquê alargar-se o universo da história à escala mundial? Pode-se tentar fazer uma ligação e concluir que a comunidade do OZ é um no fundo uma gigante família virtual, mas esse paralelismo, como tantos outros, nunca é totalmente desenvolvido no filme, tornando-se portanto um pouco forçado assumir isso. Sendo então uma mensagem que pode ser descoberta de tantas outras maneiras e até bem mais óbvias, acrescente-se, sente-se que todo o conceito da comunidade virtual estava lá por nada, não servindo qualquer propósito.

Apesar do conteúdo um pouco inconsistente, Summer Wars não deixa de ser agradável de se ver. A animação é bastante boa e dá para sorrirmos e para nos emocionarmos, deixando-nos com alguma satisfação no final. Simplesmente, nunca verdadeiramente sentimos grande empatia pelas personagens ou ficamos embrenhados no argumento. Tudo acaba por cair em seco, faltando-lhe a profundidade necessária para ser uma obra-prima.

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